
Dr Alfredo Holanda –
Ontem com o desfecho da caçada cinematográfica do moribundo Lázaro que não será ressuscitado por Jesus e nem falará com Abraão como os “Lazaros” bíblicos, este Lázaro brasileiro confirma simbolicamente o nosso nível pré civilizatório tanto quanto profetizado por Levy-Strauss.
Somos uma nação bárbara e decadente ao mesmo tempo. Temos gosto por sangue e pela tragédia Dionisiaca que termina com o sacrifício dos atores ainda no palco.
Nesse caso no palco 300 homens viris e virulentos, sem a honradez heróica dos Spartanus, na caça de um Fauno metamorfo, um demônio Tifão que é protegido e escondido por grileiros e suas posses de terras, que esconde o conflito rural.
Tanto quanto no mito escandinavo de Beowulf o herói humano que mata o demônio Grendel para depois conseguir lascivamente poder e riquezas com a mãe demônio de Grendel, porém com isso garantir a perpetuação do mau, escondido na sombra fecunda das núpcias diabólicas. Beowulf é herói por matar um demônio e oculto por ser pai de outro demônio.
Repetindo o mito arcaico de poder, riqueza, terras e apesar de não aparecer na cena brasileira as núpcias diabólicas, vemos na euforia carnavalesca do povo concluir o êxtase da orgia Dionisiaca.
Lázaro cumpriu seu papel do espiar da nossa consciência o medo e a ideia da nossa própria morte, através do instinto de preservação que barbaramente se mostra como comportamento homicida e pela atitude coletiva de linchamento.
Lázaro agora habita e dorme nos corações daqueles que festejam o linchamento.
Como o boi que se esconde na manada e se sente mais protegido do leão, o brasileiro se sente no direito de dizer: “Lázaro morreu antes ele do que eu” mas não se atentaram ao que nos disse Nietzsche:
“Aquele que luta contra demônios deve acautelar-se para não se tornar um demônio também” .
Lázaro esquartejado inibe assim a fúria demoníaca que se levanta contra todos nós.
Nesse caso Apolo (representado no herói do momento, o batalhão de 300 homens ) não vence nem transcende Dionísio ( Lázaro) mas compactua com o “Mau”. O mau não foi morto ou derrotado ele simplesmente nós contaminou enquanto nação
Pois nessa tentativa teatral de retardar o mal que se espreita na floresta, precisamos inconscientemente de sangue pelas ruas num eufemismo fálico de poder.
Com a repetição dessa tragédia grega, onde bebemos e festejamos o vinho de Dionísio, confirmamos também a impotência do nosso sonho tropical de beleza apolínea. Ou seja, qualquer possibilidade de fazer valer a cidadania se decompõe no corpo esquartejado a céu aberto e repetido pelo humor macabro dos memes que minimiza a realidade.
O “Mau” achou morada no coração de todos esses que vibraram embriagados e extasiados com a caçada mórbida. Agora são ironicamente uns lazarentos, vencidos pela sombra da morte e pensam que dormem tranquilos na alcova fecunda dos reis que usurpam as terras e matam os homens.
Mais uma vez o povo aplaudiu a tragédia quando os reis precisam se desfazer de seus demônios. Reis que em sua opulência alimentam e esconde seus filhos bestiais
O mitologema nós explica de forma clara ao festejar a morte de uma Quimera somos pai da próxima Quimera.
Dr Alfredo Holanda Psiquiatra com formação em Terapia Analítica assumindo o debate da cosmovisão Junguiana.