Análise do filme Melhor Impossível

Lauro Caracas –

 

O filme conta a história de Melvin, um famoso escritor residente da cidade de Nova York, sem muitos amigos. Suas relações sociais são o seu vizinho Simon, o empresário Frank e a garçonete Carol, os quais ele agride verbalmente, com preconceitos. O que se repete em outras situações, com outros sujeitos, onde ele busca algo do corpo do outro, para que possa apontar exacerbadamente, como um “defeito”. O que provavelmente pode estar ligado a uma defesa contra si mesmo.

Melvin, sofre de sintomas clássicos de neurose obsessiva, ideias terríveis, que sempre voltam e que requerem o cumprimento de certos rituais para que não se torne realidade. Ao longo do filme, mostra diversos rituais compulsivos de Melvin, não pisar em linhas, comer com seus próprios talheres, repetir a forma de trancar a porta, não suporta ser tocado pelo outro.

A sua ideia obsessiva onde há uma conexão entre a ideia e o sintoma. Suas tarefas são realizadas diariamente iguais todos os dias, provavelmente ligado ao medo de acontecer algo terrível a ele ou a quem ele ama ( como no caso  Homem dos Ratos de Freud)

Carol, a garçonete, realiza um furo em sua organização, quando falta o trabalho. Melvin fica agressivo e não consegue comer, pois a “sua garçonete”, não estava lá para lhe servir. Isso para o obsessivo é uma dor insuportável, pois, tudo que foge do seu controle, lhe aterroriza.(momento que pode ser pior dos histéricos)

Melvin, paga os atendimentos médicos do filho de Carol, uma forma de controlar, de manter ela na posição de servente. Para o obsessivo, o outro é o mestre e o escravo ao mesmo tempo. Ou seja, aquele em que ele coloca no altar para que nada lhe falte, mas também que esse outro não deseje. Assim como se repete com Simon, que sofre um assalto e precisa de ajuda em algumas tarefas, como cuidar do seu cachorro e cuidar de si mesmo. Sendo assim, ele mantém tudo sobre controle e regras, imposta por um superego tirânico.

Mas, ao mesmo tempo que faz de tudo para controlar o outro, ele começa a questionar sobre seus sentimentos, quando é convocado a levar Simon a outra cidade, para  que possa pedir dinheiro ao seus pais. Essas realizações de Melvin, faz com que ele se sinta bem. Ele se percebe fazendo algo pelo outro. A transferência de sentimentos com Carol e Simon, vai se apresentando ao longo do filme. Melvin vai aprendendo a lidar com sua neurose. A neurose obsessiva de Melvin continua em suas ideias e atitudes repetitivas, a forma como organiza seus objetos externos para que possa organizar o seu psíquico interno.(além de seu discurso ao longo do filme)

A viagem entre os três faz diferença na vida de Melvin, onde ele faz de tudo para agradar a Simon e Carol, tudo muito programado e organizado, mantendo tudo no seu controle. Carol sempre implica, faz um furo no discurso de Melvin, fazendo com que ele escute os outros. Simon, fala de sua relação com pai e de sua dificuldade em enfrentá-lo, devido às agressões em falas preconceituosas e um abandono sofrido. Podendo ter uma ligação na sua transferência com Melvin e a forma como lhe trata.(possivelmente colocando no lugar de pai)

Dessa forma, Melvin acaba por falar um pouco de sua relação conturbada com o seu pai, que lhe batia se ele errasse alguma nota no piano, isso pode estar relacionado à o início de sua neurose obsessiva.(ou sua escolha inconsciente de neurose, se eu errar meu pai fica com raiva de mim)

Carol, em um jantar, escuta Melvin, que, fala sobre suas dores e angústias a respeito de sua verdade sobre a sua neurose obsessiva. Sua dificuldade em lidar com os seus sentimentos, de consultas com psiquiatra e remédios. Melvin se sentiu bem ao cuidar de Simon dando-lhe um lugar para ficar em sua casa, pois o mesmo decidiu resolver sua vida sem pedir apoio aos pais.

Em uma fala com Simon, Melvin, fala sobre como Carol, e de como ela fez com que ele mude de posição, quando fala sobre o seu “velho jeito de ser”,( importancia da fala e da intervenção)  e que pode ser melhor, um “apesar de”, no sentindo de saber de sua neurose, e lidar melhor com ela. Melvin pensa sobre os seus comentários, caminha junto com ela e ao falar elogios, ele cita: – como ela é uma “boa mãe”. (significante a ser observado) Não sabemos muito sobre a sua família, mas supostamente, a sua neurose pode estar relacionada a sua infância.  O filme termina com a fala de Melvin “eu posso fazer melhor”, ou seja, apesar de sua neurose obsessiva ele pode ser um sujeito que trabalha, ama e vive em sociedade. Um homem que duvida de seu próprio amor permite-se, ou, antes, tem de duvidar de alguma coisa de menor valor.   Isso se repetia nas relações de Melvin, que ao olhar suas repetições, passou a elaborar e assim concluir algo a respeito de si mesmo e de suas relações com o outro.

 

NEUROSE OBSESSIVA

 

O que caracteriza a construção de uma neurose, é o que o Eu está submetido às exigências da realidade imposta pelo super Eu. O sujeito obsessivo passa a ter falsas conexões psíquicas, e assim, tenta tirar pensamentos com representações incompatíveis, que gera uma série de rituais. Eles esforçam-se por protelar qualquer decisão, são incapazes de chegar a uma decisão em matéria de amor, possibilidade da morte, vendo essa como solução para os seus conflitos. Eles demandam um desejo impossível, para ele tudo pode ser feito melhor. As coisas são como o Outro quer. Ele constrói um outro que pensa, no desejo de manter esse outro intacto, se livrando da angústia de castração, no momento que esse outro se mexe sem ele, ou as coisas saem de sua ordem gera uma série de conflitos podendo atuar como o pior do histéricos, pegando de empréstimo. Ex: Não lhe falta nada, ela tem tudo que precisa, ela não precisa trabalhar.

Ele usa estratégia para se apropriar do objeto, transformá-lo em morto, um morto não deve gozar! Um morto que goza é um traidor. O obsessivo anula o desejo do Outro, transforma tudo em demanda, pois o Outro comanda, vigia a todo momento, o outro é o senhor, mas o escravo ao mesmo tempo.  O obsessivo teme a lei, e por isso solicita que ela seja lembrada, como castigo. Reivindica um mestre “um pai ideal que faça a lei e que sustente, na exterioridade, a ilusão da unicidade, a não castração”. Pai Morto , pai simbólico, um lugar onde há limitação do gozo, oferece um lugar para a identificação tornando possível a relação entre lei e objeto e, portanto, lugares simbólicos para “homem e mulher”.

A dúvida corresponde à percepção do sujeito e de sua própria indecisão a qual consequência da inibição de seu amor através de seu ódio, dele se apossa diante de qualquer ação intencionada. A dúvida é, na realidade, uma dúvida de seu próprio amor – que devia ser a coisa mais exata em sua mente como um todo; e ela se difunde por tudo o mais, sendo mormente capaz de ser deslocada para aquilo que é mais insignificante e sem valor.

A compulsão é, por outro lado, uma tentativa para alguma compensação pela dúvida e para uma correção das intoleráveis condições de inibição das quais a dúvida apresenta testemunho.

Na neurose obsessiva o sujeito recalcado, retorna como simbólico e o fenômeno é o sintoma. As estruturas servem para função da direção de análise, orientação e condução da análise, formas de negação e da castração no Édipo. Realidade vai de encontro a imposições do supereu. O sujeito obsessivo cria falsas conexões psíquicas na tentativa de retirar do pensamento alguma representação incompatível através de outros pensamentos, ritualísticos para conseguir lidar com tal incompatibilidade..  O destino da ideia é desaparecer do consciente. O conteúdo se distancia da representação recalcada por deformações ou por elos que se interpõem.

Com base nas discussões apresentadas nesse trabalho pôde-se compreender que a estrutura neurótica obsessiva é um tipo de estrutura que realiza várias conexões através de pensamentos ritualísticos na tentativa de retirar da consciência algumas representações que foram conflituosas em determinado momento da vida do sujeito. Desse modo, o indivíduo cria uma série de estratégias ou pensamentos obsessivos a fim de lidar com essa situação de forma mais tolerante. O debate empreendido tem a finalidade de apontar qual a função da psicanálise no manejo com o sujeito obsessivo, identificando que a psicanálise pretende fazer o indivíduo falar sobre suas demandas, a fim de que este possa ressignificar o afeto mal elaborado.

Referências

DOR, Joël. Estruturas e clínica psicanalítica. Trad. Jorge Bastos e André Telles. Rio de Janeiro: Taurus-Timbre, 1991.

FREUD, Sigmund. o Pequeno Hans e o Homem dos Ratos. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (J. Salomão, trad., Vol. 9 – Trabalho original publicado em 1909). Rio de Janeiro: Imago, 1996.

Lacan, Jacques, 1901-1981 Ll29s O seminário, livro 5: as formações do inconsciente (1957- 1958)/Jacques Lacan; texto estabelecido por Jacques-Alain Miller; [tradução de Vera Ribeiro; revisão de Marcus André Vieira].- Rio de Janeiro: Zahar, 1999.

Leite, Márcio Peter de Souza A Negação da Falta: cinco seminários sobre Lacan para analistas Kleinianos – Rio de Janeiro: Relume Dumará,1992

Melman, Charles, 1931- A neurose obsessiva J Charles Melman; editor: José Nazar. – Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2004.

 

 

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